Hoje vou contar para vocês como foi meu intercâmbio de um ano para o Canadá, pelo programa Ciência sem Fronteiras em 2014. Vocês vão saber de todos os detalhes, como foi o processo seletivo para conseguir a bolsa, onde estudei, onde morei, qual foi o impacto dessa experiência na minha vida, quanto gastei, se eu era fluente antes de ir e como estudei inglês, trabalho na perícia em outros países etc. Vamos lá?
Processo seletivo
Na época em que entrei na graduação (em 2012), já havia o programa Ciência sem Fronteiras (CsF), em que o governo abria algumas vagas de intercâmbio para estudantes da graduação, com direito a bolsa de estudos para custeio no exterior. Já sabendo disso, me programei para me inscrever no programa na primeira oportunidade que tivesse. Essa oportunidade surgiu em 2013, quando já estava no segundo ano da faculdade (na época estudantes do primeiro ano não podiam concorrer). O edital teve vários países, e o meu escolhido para pleitear a vaga foi o Canadá. Escolhi pela fama de receptividade dos canadenses, pelas ótimas universidades e qualidade do ensino, pelas possibilidades de turismo, além da afinidade pelo frio.
Como eu já vinha pesquisando sobre os editais desde o início da graduação, já sabia que precisava, dentre outros requisitos:
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Nota mínima de 600 no ENEM (eu podia usar o que havia feito na época do vestibular)
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Nota mínima no teste de proficiência em Inglês (TOEFL) – cada país exigia um teste e pontuação mínima diferente.
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Histórico da graduação (não sabia bem os critérios, mas que queriam boas notas)
Comecei a fazer cursos de inglês em julho de 2012, conciliando com a faculdade. Fiz 3 módulos intensivos (usei todas as minhas férias para estudar inglês) e os restantes em ritmo normal (durante o semestre). Assim, consegui concluir todos os módulos do curso (iniciante, intermediário e avançado) e mais um módulo de conversação em um ano e meio. Ao mesmo tempo, já treinava por conta própria para o TOEFL, estudando o teste, fazendo exercícios gratuitos na Internet, baixando programas que simulavam o teste e provas anteriores. Fiz o teste do TOEFL em julho de 2013, quando fazia inglês há um ano. Apesar de não ser fluente no idioma, estudar especificamente para essa prova me deixou muito preparada, e acabei atingindo uma nota muito próxima da máxima (108 de 120). Isso acabou sendo uma vantagem muito grande para mim, pois a escolha das universidades também dependia da nota no teste de Inglês (universidades mais renomadas exigiam notas maiores).
Passei com tranquilidade na seleção, eram muitas vagas e creio que só não passou quem não atingiu o mínimo de proficiência na língua. Isso já garantia minha ida ao Canadá e a bolsa, mas ainda precisava ser aceita por uma universidade canadense. Para enviar minhas applications, vi as grades de ensino das universidades para achar alguma que fosse mais compatível com a do curso aqui no Brasil, para que pudesse tirar melhor proveito das matérias. Acabei escolhendo como primeira opção (e fui aceita nela) a University of Guelph (UofG), em Ontario, perto de Toronto.
No Canadá
Embarquei para o Canadá em dezembro (dia 24, para ser mais exata), com uma amiga que moraria comigo lá em Guelph. Fomos muito bem recebidas pela nossa “mãe canadense”, Rosana, que nos ajudou a encontrar casa antes de irmos, ajudou na adaptação, primeiras compras, enfim, com tudo o que precisamos no período em que estivemos lá. Eu morava em uma casa alugada com mais cinco brasileiras, todas no Canadá pelo CsF. Nos conhecemos por meio do grupo do CsF no Facebook.
Para me sustentar no Canadá, recebia um salário mínimo por mês (cerca de 1400 dólares canadenses), e usava esse dinheiro para custear moradia, alimentação, lazer – tudo. Além dessa ajuda mensal, o CsF forneceu auxílio para as passagens de ida e volta. O dinheiro era mais do que suficiente para os gastos básicos, e o restante eu guardei ou usei para viagens. Acabei voltando para o Brasil com alguns eletrônicos para revenda e com um montante em dinheiro (o que, futuramente, foi usado para custear meus estudos para concursos e para realizar o sonho de comprar um piano).
A experiência de viver em outro país era surreal. Havia dias em que eu não acreditava que estava lá; foi algo por que lutei desde o primeiro dia da faculdade – fiz o curso de inglês em pouquíssimo tempo e me dediquei demais para manter minhas médias na graduação acima de nove. Cada dia lá foi um sonho realizado, sofri, sim, com saudade e com outros problemas, mas o aprendizado que eu tirei foi muito maior que qualquer obstáculo. Aprendi a me conhecer melhor e a ver o melhor em todas as situações, a me virar sozinha mas também a pedir ajuda. Essa bagagem de vida foi a maior vantagem que tirei do intercâmbio. Na volta, cheguei a escrever um texto meio emotivo sobre a experiência, segue o trecho final:
“Vou lembrar desse sonho como uma das minhas maiores conquistas, um dos maiores aprendizados. O Canadá não me mudou, apenas me fez ter mais certeza em tudo que eu já acreditava, e me fez ver que o mundo é muito maior e guarda muito mais surpresas do que nós nos permitimos ver quando estamos acomodados com a nossa realidade.”
Ah, quando eu fui para o Canadá tinha ótimo domínio teórico (reading, writing e listening) do Inglês, mas ainda era muito travada na conversação – não posso dizer que era fluente. Não tive muitos problemas com a adaptação ao idioma, estudei muito antes de ir (dentro e fora do curso de inglês), então só demorei um pouco para destravar o speaking. Importante ressaltar que, assim como nos concursos, o estudo por conta própria é que fará diferença no resultado final. Eu me dediquei muito em casa, revendo os materiais da escola de inglês (Influx, em Maringá), via séries com legendas em inglês, fazia milhares de exercícios do TOEFL, comprei outros livros sobre o idioma, lia e escrevia em inglês sempre que possível, fazia listas de palavras novas, além de usar e abusar do dicionário. Também usava qualquer aplicativo que encontrasse para treinar (tipo Duolingo).
Sobre o país, de forma geral, não tenho nenhum defeito a colocar. As pessoas são muito receptivas e você conhece gente de todo canto do mundo. Fui muito bem acolhida pelo Canadá, conheci paisagens exuberantes e pretendo voltar mais vezes para conhecer mais lugares. Além da educação diferenciada, a segurança é um dos pontos altos do país, e uma outra grande diferença para o Brasil é que mesmo nas cidades pequenas você encontra tudo de que precisa – várias opções de gastronomia, lazer, compras etc.
No Canadá, o semestre tem quatro meses. Como fiquei um ano, fiz três semestres na universidade. Desses, foram dois semestres cursando matérias na faculdade, e um fazendo estágio.
Na UofG, me inscrevi nas disciplinas que tinham mais a ver com o curso no Brasil, mas na época já sabia que não conseguiria aproveitar essas matérias no Brasil porque no Canadá as aulas práticas ficam praticamente restritas aos estudantes de pós graduação, e eu precisava dessas horas para fechar a carga horária no Brasil. Eu não estava matriculada em nenhum curso específico (Biomedicina, por exemplo), então escolhi matérias de diferentes cursos undergrad(graduação) dentro da universidade.
O sistema de ensino lá é muito diferente do Brasil, e o aprendizado fica muito por conta do aluno. Tive bastante dificuldade no primeiro semestre, pois peguei matérias de terceiro e quarto ano e, principalmente, na disciplina de Química (Structure and Bonding) que resolvi cursar. A exigência era muito grande, as provas eram difíceis mas com bastante dedicação foi possível passar em todas. Além, logicamente, da dificuldade inicial em acompanhar os professores falando em inglês (mas isso foi superado bem rapidamente).
Como comentei da incompatibilidade de carga horária das disciplinas (por não ter aulas práticas lá), não consegui equivalência de nenhuma delas no Brasil, o que estendeu o período do meu curso por mais um ano (totalizando 5 anos de graduação). Na época que fiquei lá o curso ficou trancado, e quando voltei continuei de onde parei, junto com as turmas dos meus calouros.
O que aprendi nas disciplinas da faculdade me deu certa facilidade com algumas matérias que viriam depois no Brasil, mas nada “além do normal”. O foco das disciplinas lá era teórico, e no Brasil o foco era na prática, o que também não ‘ajudou’ muito nesse aproveitamento. Não tive nenhuma vantagem a mais no estudo para concursos (totalmente diferente do estudo para graduação), e muito menos na prática da perícia. São mundos diferentes, por assim dizer. Vários dos colegas que conheci durante o intercâmbio voltaram para o Canadá ou fizeram estágio/intercâmbio/mestrado em outros países depois de colar grau- então creio que seja uma grande vantagem para quem quer seguir essa via, de trabalhar, morar ou estudar no exterior.
Para o semestre de estágio, precisamos fazer nossos currículos e também encaminhar a application para o setor de estágios. Consegui um não remunerado (algumas poucas pessoas conseguiram remuneração) no laboratório de Microbiologia e Bioquímica, do Dr. Joseph Lam na UofG. Eu ficava oito horas por dia no laboratório, e o objetivo do meu projeto era expressar e purificar as proteínas MigA e WapR em quantidades suficientes para realização da cristalografia e consequentemente desvendar suas estruturas, que são de grande importância no desenvolvimento da fibrose cística. O estágio foi maravilhoso, aprendi muito de técnicas laboratoriais, aprendi a conduzir um projeto quase por conta própria, a escrever melhor, fazer apresentações e no fim apresentei um pôster sobre ele em um simpósio da UofG.
Gastos do intercâmbio
Vou fazer uma lista “meio por cima” dos gastos que tive lá, mas sinceramente não lembro tudo de cabeça, e pelo tempo que transcorreu, muita coisa já deve ter mudado.
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Curso de Inglês – devo ter investido uns 5 mil reais somando todos os módulos
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Passaporte – na época paguei cerca de 250 reais
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Visto e exames de saúde – creio que foram 300 reais do visto e cerca de 500 reais dos exames de saúde para o visto
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Passagens – paguei bem barato na época, mas atualmente uma passagem para o Canadá custa de 1.500 a 2.000 reais (só um trecho)
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Custo de vida – considerando que eu não gastava tudo o que recebia, mas também economizava muito em moradia (por morar com mais cinco pessoas), pode considerar o salário mínimo (1.400 dólares canadenses na época) como suficiente para viver um mês no Canadá.
As passagens e os gastos mensais foram bancados pelo programa, mas o que veio antes foi por minha conta. Hoje o programa Ciência sem Fronteiras não existe mais, e os custos também devem ter aumentado em função do tempo decorrido, então é preciso uma pesquisa mais meticulosa antes de pensar em fazer um intercâmbio. Procurem outros programas (algumas universidades lançam editais e fornecem bolsas semelhantes), até intercâmbios bancados pelas universidades estrangeiras, ou agências especializadas nisso. Não é um dinheiro que eu teria para pagar por conta, só fui porque receberia bolsa do governo, mas quem tem condições ou quer juntar dinheiro para isso deve se programar com antecedência e pesquisar muito sobre o custo de vida no país de destino. Também é muito importante se informar com as universidades ou órgãos em que vocês querem estudar/trabalhar, para conhecer seus processos seletivos e a possibilidade de intercâmbio nesses lugares.
Já adianto para quem me pergunta sobre o trabalho na perícia no exterior, o que sei que é que cada país tem suas próprias regras e especificações, então o mesmo se aplica aqui – pesquisem e se informem com os respectivos governos. Não tenho como passar informações sobre um tema que pode variar tanto, e também não sei se trabalhar na perícia em outro país contaria como experiência em uma prova de títulos aqui no Brasil.
Bom, esse foi um resumo da minha experiência, e tentei abordar as principais dúvidas que recebo sobre o intercâmbio. Se tiverem mais perguntas, deixem nos comentários abaixo. E, se curtiram, compartilhem! 😉