Olá, galera! Para dar continuidade à nossa coluna, hoje vocês vão conhecer um pouco da Daniela Berti, Perita Criminal Oficial da Polícia Científica de São Paulo. Tive o prazer de conhece-la pessoalmente, quando me convidou para conhecer o Instituto de Criminalística aqui da minha cidade (Marília-SP), onde ela trabalha. Espero que esse depoimento inspire muitas pessoas, assim como me inspirou! Agora vamos ao que interessa?
Olá, Daniela! Obrigada por topar colaborar com a coluna! Você pode contar um pouco de você primeiro? Cidade natal, em que e onde se formou, quando entrou para a Perícia, onde está trabalhando no momento, se está cursando ou cursou alguma pós graduação, outras atividades (ex. dar aulas, palestras etc.).
Olá, futuros peritos, meu nome é Daniela, sou nascida em Araraquara, cursei farmácia em Alfenas-MG, me formei em 2010 e trabalhei 5 meses na Droga Raia. Saí de lá pois queria concurso público, desde então passei a me dedicar às carreiras policiais. Entrei para a Perícia do Estado de São Paulo no concurso de 2012, primeiramente fui lotada em Araçatuba e agora estou em Marília trabalhando na toxicologia, onde sou responsável pelos laudos definitivos dos entorpecentes. Nunca fiz pós e não dou aulas pois sou bem tímida e falar em público não combina muito comigo.
O que te levou a escolher a área de Perícia Criminal?
Sempre me interessei pela área policial, quando em 2008 decidi que queria ser perita. Visitei o Instituto de Criminalística da minha cidade, não me mostraram nada, fiquei até triste. Ainda estava na faculdade. Um professor acabou mencionando a Perícia criminal na aula dele, no final perguntei o que ele achava da profissão. Ele disse que já havia prestado (não passou) porém achava perigoso pois eu poderia sofrer ameaças e minha família também. Depois disso eu desanimei, fiquei preocupada. Mas não durou 1 dia, decidi que queria prestar o concurso de Agente da Polícia Federal, comprei umas apostilas e não estudei nada, pois a faculdade de farmácia não é fácil e consome muito tempo. Decidi que se tivesse que me preparar, seria depois da faculdade. Minha ideia depois que acabei a faculdade era conciliar trabalho e estudo, então eu acordava às 6h, ia na natação às 7h, entrava no cursinho às 9h, almoçava, trabalhava das 16h até 00h na farmácia e tentava estudar nos intervalos. Eu odiei meu trabalho, odiava ser vendedora de farmácia, ia chorando trabalhar, foi então que tive uma conversa com meu pai. Perguntei se eu poderia sair do emprego e só estudar, pois o concurso de Agente da PF estava para sair e eu queria fazer daquilo o meu trabalho (estudar e estudar e estudar). Ele me disse que comida não iria me faltar, já o resto…. Bom, comida era a única coisa que eu precisava então não pensei duas vezes, pedi demissão. Me dediquei por um ano, não passei para a segunda fase por pouco, logo após saiu o concurso para escrivão da PF porém ele foi suspenso pois não havia vagas para deficiente. Como ninguém sabia por quanto tempo iria ficar suspenso, eu desanimei e comecei a pensar em outras coisas, talvez um concurso mais simples para que eu pudesse pelo menos ganhar algum dinheiro e continuar estudando. Não é fácil ver todos seus amigos viajando, comprando carro, combinando festas, passeios e etc. e você ali, sem dinheiro para nada, sem certeza de nada…só quem estuda sabe como é esse sentimento.
Nisso eu descobri que o edital da perícia de SP tinha saído, olhei as matérias e senti reanimar a vontade de ser perita. Me dediquei de segunda a sábado de manhã, até a prova. (eu estudava em média 5h líquidas por dia…as vezes um pouco mais, as vezes um pouco menos).
Não é fácil ver todos seus amigos viajando, comprando carro, combinando festas, passeios e etc. e você ali, sem dinheiro para nada, sem certeza de nada…só quem estuda sabe como é esse sentimento.
Na sua opinião, qual o melhor e o pior aspecto da profissão?
O melhor aspecto é você se sentir útil para alguém, poder ajudar, mostrar a verdade mesmo quando todos falam o contrário. Como todo crime deixa vestígio, as pessoas podem até falar o contrário, mas com um trabalho bem feito, na maioria dos casos, você consegue descobrir a verdade e por consequência ajudar alguém, e essa sensação é muito boa. Nunca me esqueço de um acidente que eu atendi. Quem estava “certo” acabou falecendo, enquanto o culpado ficou vivo e falou o contrário do que realmente aconteceu. Com a perícia a gente conseguiu provar quem estava errado. Infelizmente o inocente morreu, mas a sensação foi de dever cumprido. Tem uma frase muito legal que fala que os peritos são a última voz da vítima. É bem isso mesmo. O pior aspecto é que a gente está lidando sempre com a desgraça de alguém, então o ambiente é bem pesado, vemos coisas muito feias, desacreditamos da capacidade das pessoas, vemos o tamanho da maldade que existe no mundo portanto temos que ter jogo de cintura para encarar tudo isso.
O melhor aspecto da profissão é você se sentir útil para alguém, poder ajudar, mostrar a verdade mesmo quando todos falam o contrário.
Existiu algum momento durante a sua preparação para o concurso, durante o curso de formação ou em exercício que te fez pensar em desistir da Perícia?
Jamais. Durante a preparação a gente passa por diversos momentos de dúvidas: será que vou passar? Quando vou passar? Mas eu simplesmente seguia com o que tinha que fazer. Às vezes eu parava, chorava, lavava a cara e continuava. Eu sabia que se continuasse tudo seria questão de tempo. Na minha cabeça eu só ia parar quando conseguisse ser policial. No curso de formação acho que ninguém pensa em desistir pois estamos todos no mesmo barco, longe da família, tendo que assistir aulas e fazer provas. Isso dá força para continuar, sem contar na expectativa que a gente fica.
Como você acha que um farmacêutico pode se destacar na perícia? E quais as principais atividades no laboratório de Toxicologia Forense?
Na verdade, o concurso para o estado de SP não exige uma formação específica, então todo mundo faz todo tipo de serviço. Hoje eu estou na toxicologia pois quando cheguei no núcleo de Marília era onde tinha vaga, acabei gostando e tem a ver com a minha formação. No laboratório nós somos responsáveis pelo laudo definitivo de entorpecentes. Resumindo, temos que fazer os testes para confirmar que aquela droga é, de fato, maconha, cocaína, LSD, ecstasy, etc. Nossa rotina é essa, receber as drogas e fazer as análises.
O perito farmacêutico tem a atuação mais restrita a laboratório ou também acaba atuando em locais de crime?
Como eu disse, não há formação específica, um engenheiro pode atuar no laboratório assim como um farmacêutico pode atuar na rua, em locais de acidente de trânsito, homicídio, furtos. Eu trabalhei dois anos e meio no plantão de rua, atendendo todo tipo de crime. Logo que a gente chega para trabalhar, temos que fazer plantão de rua; raramente, dependendo da cidade que você vai, caso estejam precisando de alguém nos laboratórios e nenhum perito antigo queira ir, então abrem as vagas para os peritos novos. Aconteceu na minha turma de uma perita que entrou na mesma época nunca ter ido para a rua, mas como eu disse é exceção. Para quem vai prestar perito de SP se prepare para ir para a rua.
Tem muita diferença na escala e horários de trabalho do perito de local de crime e daquele que trabalha em laboratório? O mesmo perito que fez o exame de local de crime pode também participar dos exames complementares?
Depende muito da cidade. Geralmente os laboratórios não trabalham de final de semana e à noite, com exceção da toxicologia que em muitas cidades funciona 24h. Mas em uma mesma cidade todos os peritos fazem a mesma quantidade de plantões, porém os horários são diferentes, o perito da rua tem que estar sempre disponível para quando houver algum local de crime, por isso a necessidade de se ter perito trabalhando dia e noite. Eu já atendi alguns locais que depois o delegado pediu um exame complementar. Eu mesma fiz. Mas quando se exige estudo específico, por exemplo, saber se aquela munição saiu daquela arma, então o perito do laboratório de balística que faz o exame e não o perito da rua.
Como funciona a escolha para ser perito de campo ou de laboratório?
Via de regra quando o perito começa a trabalhar vai sempre fazer rua. Pro laboratório tem que ter vagas, quando surge uma vaga, o diretor pergunta se há interesse, primeiro para os peritos mais antigos e depois para os mais novos.
Em alguns estados, o cargo de Perito está subdividido em áreas específicas (Perito Odontolegista, Bioquímico etc.), enquanto em outros, como em São Paulo, o ingresso na carreira é por meio de um só cargo, Perito Geral, que engloba vários cursos superiores. Você acha que essa divisão (ou a falta dela) tem impacto na carreira e atividades do Perito? E quanto à dificuldade do concurso público, em si?
Sim, no começo há maior dificuldade no dia a dia da profissão, porém nada que prejudique os exames, pois na academia de polícia a gente tem uma base de todas as áreas então acabamos aprendendo um pouco de tudo. Além disso, sempre há pessoas especializadas e capacitadas para nos ajudar quando chegamos no estágio em nossas cidades de trabalho. Claro que se fosse um concurso dividido em áreas específicas seria mais fácil o aprendizado, porém todo mundo que está ali tem capacidade de aprender e até de se tornar um expert no assunto. Os peritos estudam cada caso, debatem se necessário, tiram dúvidas e nunca soltam um laudo sem ter certeza. Olha meu exemplo, farmacêutica, tive que aprender mecânica, acidente de trânsito e até freio de caminhão, então é mais difícil pra mim que nunca ouvi falar em nada disso do que para uma pessoa que já teve isso durante a faculdade.
Para finalizar, se você pudesse dar uma dica para quem almeja o cargo de Perito Criminal, qual seria?
Se vocês querem ser peritos por amor a essa profissão, não desistam! A perícia precisa de profissionais dedicados, que gostem de estudar, que sejam curiosos, que deem o máximo. Eu tenho certeza que Deus não coloca em nossos corações um desejo que seja impossível de se realizar, então se você tem vontade de ser perito minha dica é: continue. Faça o que tem que ser feito, se dedique e espere a posse, que com certeza ela virá. Boa sorte aos futuros colegas de trabalho.
– Fim